terça-feira, 30 de novembro de 2010
Live at the Brixton Academy
Fomos ontem à Brixton Academy ver os The National. A sala é um antigo teatro Arte Nova, com a dimensão ideal para concertos. O ambiente é uma mistura de Coliseu e Voz do Operário e como fomos dos primeiros a entrar consegui tirar esta foto de uma natureza morta com guitarras, bateria, baixo e a luz dos projectores. O concerto em si foi muito bom. O vocalista começou com uma pose séria e fato e gravata, mas foi-se transformando progressivamente num Caliban alcoolizado, com gritos, convulsões e longas incursões pelo meio do público. No final, já sem forças, cantou a última música (Vanderlyle Crybaby Geeks) sem microfone entre duas guitarras acústicas. Saímos para a noite gelada com um zumbido nos ouvidos e na manhã seguinte, esta manhã, nevou.
domingo, 28 de novembro de 2010
Previsão de tempo para utopia e arredores*
Boa parte dos meus textos têm uma natureza meteorológica. Falar do tempo é uma forma de manter uma conversa quando não se tem assunto. Para além desse aspecto, é verdade que a mudança de Lisboa para Londres é acompanhada por uma maior consciência em relação ao clima. As estações do ano são mais marcadas e as paisagens dos extensos parques públicos mudam de semana a semana. Pelo termómetro, estão -4º C lá fora, o relvado está coberto por uma fina película de gelo. De forma aparentemente paradoxal, nunca passei tão pouco frio no Inverno. As casas estão preparadas para a época e não preciso de andar a arrastar um aquecedor pela trela de uma divisão para a outra ou de ver televisão enrolado numa manta. Quando saimos, com mais camadas de roupa que uma varina da Nazaré, o frio entranha-se com uma força revigorante, como os banhos de mar no primeiro dia do ano a que assistimos pelo telejornal. Um mergulho rápido nas ruas de Londres e depois o regresso ao aquecimento central.
(*Título emprestado por Charles Simic)
(*Título emprestado por Charles Simic)
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
Tendo passado a infância e adolescência em escolas de Linha de Sintra, não há praticamente nada que não tenha visto ser feito numa sala de aula. Vi professores a chorar, alunos a sairem pela janela ou a jogarem futebol no fundo da sala. Talvez tenha existido uma época idílica em que os estudantes levavam maçãs polidas aos professores e recitavam a tabuada dos sete de pé ao lado da carteira (segundo a minha mãe, até saudavam os professores de braço estendido todas as manhãs), mas isso foi muito antes do meu tempo. E, apesar da aparente insegurança, desde pelo menos os oito anos que passei a ir sozinho para a escola com os meus amigos, num percurso que, a partir do Secundário, incluia uma viagem de comboio que passávamos a trocar cassetes de música ou em coreografias de indiferença com o sexo oposto. Na verdade, na memória selectiva daqueles tempos, só quase me consigo lembrar das tardes de terça-feira passadas a ler o Blitz, das longas conversas atrás do pavilhão com os amigos e dos nomes das raparigas por quem quase morri de amor, vez após vez. Dizem-me que as coisas estão piores, muito piores. É verdade, o Blitz acabou, já não há mais pregão da semana.
Os pessimistas são vistos como sábios, os optimistas como ingénuos. Não há comentário a que o sarcasmo não acrescente um tom de inteligência. No entanto, de um ponto de vista lógico, não há motivo para que as previsões de um pessimista estejam certas mais vezes que as de um optimista. São ambos defeitos de carácter e, como na guerra, temos de escolher um lado. Por isso, embora me digam que o estado social vai acabar dentro de momentos, que os juros da dívida vão atingir os 15%, que o Sporting não voltará a ganhar um campeonato, que isto já não é o que era, sou suficientemente ingénuo para continuar a respirar em tempos de austeridade e a ouvir, enquanto escrevo, a Billie Holiday a cantar Good Morning Heartache, com voz de quem está alegremente resignada a perder o jogo.
sábado, 20 de novembro de 2010
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
Um dos livros que trouxe da John Sandoe foi Sonnets from the Portuguese de Elizabeth Barret Browning, que nada mais tem de português que o título, com o qual a poeta encobriu a autoria dos poemas, alegando tratarem-se de traduções de textos de origem portuguesa. Aparentemente, o marido de Elizabeth, Robert Browning, tratava-a também por "my little Portuguese", em momentos mais íntimos que a história da literatura conquistou à reserva da vida privada. Um dos sonetos é este:
I lift my heavy heart up solemnly,
As once Electra her sepulchrul urn,
And, looking in thine eyes, I overturn
The ashes at thy feet. Behold and see
What a great heap of grief lay hid in me,
And how the red wild sparkles dimly burn
Through the ashen greyness. If thy foot in scorn
Could tread them out to darkness utterly,
It might be well perhaps. But if instead
Thou wait beside me for the wind to blow
The grey dust up... those laurels on thine head,
O my Beloved, will not shield thee so,
That none of all the fires shall scorch and shred
The hair beneath. Stand farther off then! go!
Fui fazer uma visita à John Sandoe, uma pequena livraria de Chelsea onde há livros espalhados por todo o lado, como no sonho de um bibliófilo: nas escadas que levam ao primeiro andar e nas que descem para a cave, alinhados em estantes ou empilhados em montes instáveis. E apesar de há muito as salas exíguas terem perdido o combate com o fluxo constante de livros, os volumes estão arrumados com uma certa ordem, por funcionários que parecem estar conscientes de que têm o melhor emprego do mundo. É utilizado o sistema inverso do da Ler Devagar, na LX Factory, onde o espaço é vasto, mas os livros encontrados apenas com muita sorte e algumas técnicas de alpinismo. Trouxe da John Sandoe algum Robert Frost, John Burnside e Elizabeth Barrett Browning. Se quiserem passar por lá, fica em 10 Blacklands Terrace.
Hora de Inverno
A mudança para a hora de Inverno tem-me deixado sonolento e letárgico. Só me apetece enroscar num canto e esperar que os meses mais frios passem. Os esquilos enterram as últimas nozes nos relvados dos parques e as folhas passaram quase todas dos ramos das árvores para os passeios. As pessoas saem do trabalho para uma noite cerrada antes das cinco da tarde. São já só vultos que se cruzam pelas ruas, a caminho de casa, e entram nas estações de metro com as golas dos sobretudos levantadas.
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
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